A Viagem de Hanno e Ganda: onde a fantasia e a realidade se encontram para nos ensinar sobre o passado e o presente
Em A Viagem de Hanno e Ganda, Tadeu Sarmento nos transporta para o século XVI, em uma aventura que mistura história, fantasia e muita reflexão entre os animais e os humanos. Esta fábula, inspirada por um fato histórico curioso, o autor nos apresenta a jornada de um elefante e seu companheiro, um rinoceronte, enviados como presente do rei de Portugal ao Papa, em Roma.
À primeira vista, a narrativa, que se assemelha a uma fábula, atribui características humanas aos animais, convidando o leitor a refletir sobre as relações entre humanos, animais e natureza. Isso fica intrinsecamente evidente, ou seja, o livro aborda temas como a ignorância, a arrogância e a dificuldade de compreender o desconhecido, utilizando o humor e a ironia incomparável para criticar comportamentos humanos que persistem até os dias atuais.
Shankar, o narrador, maravilhoso e astuto, revela um mundo repleto de nuances e complexidades. Ao adotar, por vezes, um ponto de vista quase pessoal, o narrador nos aproxima da experiência dos personagens, proporcionando uma imersão profunda na narrativa. O narrador às vezes interfere nos fatos, o que, a meu ver, é inusitado porque ele transita entre o narrador onisciente e o narrador-personagem.
Da mesma forma, à detalhada descrição dos bestiários antigos, fruto de minuciosa pesquisa, é muito bem amarrada com o humor característico de Sarmento, que nos presenteia com passagens como a dos dragões que cospem fogo e sofrem de azia. Essa combinação torna a leitura ainda mais deliciosa.
Sob o mesmo ponto de vista, a obra nos convida a refletir sobre a ignorância humana, não apenas em relação ao mundo natural, mas também sobre as relações interpessoais. A crítica à exploração da natureza e ao preconceito é sutilmente tecida na trama, convidando o leitor à reflexão. Vale se atentar para esta reflexão.
“Nós, os macacos, somos ótimos para levar informações, pois pulamos de galho em galho com velocidade. Gerações inteiras de macacos têm aprendido a ser grandes mensageiros, e eu, modestamente, sou o melhor de todos, até agora.“
Essa citação, presente na obra, exemplifica a humanização dos animais e a reflexão sobre as relações entre humanos, animais e natureza.
A viagem de Hanno & Ganda, publicado pela Editora Peirópolis, é uma obra que encanta pela originalidade e pela profundidade temática. A escrita elegante e a criatividade de Tadeu Sarmento nos presenteiam com uma leitura inesquecível. As ilustrações do Samuel Casal para este livro deu vida a cada personagem que permeia a história.
Altamente recomendado.
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Partindo de um acontecimento histórico, o livro conta a história de um curioso presente dado pelo rei de Portugal, em 1515, ao papa, em Roma. Naquela época, os humanos apreciavam oferecer regalos raros e grandiosos uns aos outros. E o que poderia ser mais raro e grandioso do que um elefante que não existia em terras europeias?
Para conseguir o presente, só mesmo pedindo ao Governador de Goa, numa Índia dominada por Portugal, que enviasse ao papa, o exótico animal. O problema é que também não existia a fotografia, e mesmo as viagens intercontinentais não eram coisa que se fizesse com facilidade. O jeito que as pessoas tinham para conhecer a fauna de terras distantes era consultando bestiários, publicações que representavam animais exóticos, com boas doses de sonho e de imaginação. E foi exatamente desse modo que o rei de Portugal conheceu os elefantes. Mas o que ele teria visto de fato? Como poderia ter certeza de que o presente, enviado ao papa, era mesmo um elefante?
Assim começa a grande confusão da viagem de Hanno e Ganda, que possui contornos de fábula, ao atribuir características humanas aos personagens animais. Contada por um inusitado narrador, a história fantástica, além de apresentar um mundo de outrora, nos fará refletir sobre ações e pensamentos humanos, e certos cacoetes e desvios que até hoje podemos observar, contribuindo para questionamentos profundos acerca de como nos relacionamos uns com os outros, com os animais e com a natureza.
Confira o processo de produção das gravuras de A viagem de Hanno & Ganda, de Tadeu Sarmento, ilustrado por Samuel Casal, publicado pela Editora Peirópolis.
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